Parque
Dom Pedro II: revitalização é miragem, degradação uma dura realidade
Desde que cheguei a São Paulo, há 56 anos, e na minha
condição de jornalista que atuou por 40 anos na Assessoria de Imprensa da Prefeitura,
testemunhei o anúncio de ambiciosos planos e/ou projetos urbanísticos,
batizados com diferentes nomes, para a revitalização do tradicional Parque Dom Pedro
II, distante menos de um quilômetro da Praça da Sé. Infelizmente, prefeito após
prefeito, nenhum foi concretizado.
Foto: Divulgação |
Um deles, apresentado à mídia na gestão de
Gilberto Kassab, foi elaborado pela Fundação para a Pesquisa Ambiental, ligada
à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP. Com um custo estimado em R$ 1,5
bilhão, teve um tímido avanço: a implosão dos edifícios São Vito e Mercúrio,
que várias administrações anteriores tentavam, sem sucesso, há anos, riscar da
paisagem paulistana.
O imenso vazio, que surgiu perto do Mercado Municipal, por
algum tempo serviu de estacionamento público para clientes do Mercadão, depois
da retirada dos escombros que sobraram dos dois prédios. Até que o terreno
municipal foi cedido pelo prefeito
Fernando Haddad, em 2013, por meio de projeto de lei aprovado pela Câmara
Municipal, com validade por 99 anos, para o SESC construir no local mais uma de
suas unidades, nos moldes das 39 existentes em diferentes bairros da Capital.
A medida, dizia-se na ocasião, abriria espaço para a
revitalização do Parque Dom Pedro II, prometida há mais de dez anos durante as
gestões de Marta Suplicy, José Serra e Gilberto Kassab, Na última proposta
apresentada, a remodelação daria à região novos pontilhões, espelhos d’agua e
até um parque linear. A lei sancionada
por Haddad concedeu um prazo de 12 meses ao SESC para apresentar à Prefeitura
um projeto de ocupação da área onde os dois edifícios foram demolidos.
Enquanto
o SESC Parque Dom Pedro II não é erguido, o espaço já oferece atividades
culturais, de lazer e esportivas à população em todos os fins de semana.
Foto autor desconhecido |
Até que se materialize a revitalização da região, que foi
a antiga Várzea do Carmo, e seu entorno, a população que diariamente faz uso
desta ligação entre o centro histórico de São Paulo e a Zona Leste, não
acredita que um dia verá a transformação do atual Parque Dom Pedro II – um mar
de carros, ônibus e viadutos, exemplo de degradação urbana ao longo de décadas -
sujo e perigoso, em um atraente parque público
dominado pelo verde.
O último plano, engavetado principalmente pelo seu custo
astronômico, começaria no primeiro semestre de 2012. De acordo com o que foi
anunciado na época pelo secretário municipal de Desenvolvimento Urbano, Miguel
Bucalem, o projeto estava dividido em quatro fases. A primeira terminaria em
2013, com a construção de um pontilhão sobre o rio Tamanduateí, para permitir a
demolição do Viaduto Diário Popular. O pontilhão possibilitaria o acesso da
área central ao atual terminal de ônibus.
Perto do terminal haveria um centro de compras para dar
mais dinamismo ao eixo comercial da Rua 25 de Março e combater o comércio
ilegal, conforme destacado pelo então prefeito Gilberto Kassab. Outra
intervenção do projeto: a construção de um estacionamento público, com 2.600
vagas, ao lado do Mercadão. E ainda dentro da primeira etapa do plano, no local
da demolição dos edifícios São Vito e Mercúrio, o SESC implantaria uma unidade
para atender 15 mil pessoas, segundo disse o empresário Abram Szajman, que era
o presidente da entidade.
A segunda fase do projeto, que tinha previsão para
ocorrer entre 2011 e 2014, falava na construção de dois túneis em cada um dos
lados do rio Tamanduateí, para ajudar na transposição leste/oeste. E, na
terceira, no período de 2013 e 2015, seria feita a demolição dos viadutos 25 de
Março e Antônio Nakashima para a restauração do sistema viário da região
Finalmente, em sua última etapa . a revitalização urbana
estabelecia para o período de 2014 a 2016 que o Terminal Urbano Parque Dom
Pedro II e o Terminal Expresso Tiradentes seriam instalados ao lado da estação
Dom Pedro do metrô, permitindo a construção de um novo terminal intermodal. E
também fazendo parte desta fase, seriam implantadas lagoas de retenção na área
do terminal com função paisagística e de sistema de drenagem. Depois de tudo
anunciado, ficou faltando só o mais importante: a abertura da licitação para
saber quem executaria todas as obras do ambicioso projeto.
Mas, a administração de Fernando Haddad, encerrada em
2016, optou por um plano mais “pé no chão”, com medidas econômicas e sociais e
não apenas urbanísticas na região, levando em conta que a área estava tomada
por moradores de rua e usuários de drogas. O prefeito tentou desenvolver na
região um projeto semelhante ao do programa Braços Abertos, pelo qual usuários
de crack são convidados a trabalhar e morar em imóveis e hotéis pagos pelo
Município O modelo foi implementado
inicialmente na Cracolândia, mas não chegou ao Parque Dom Pedro II.
Foto autor desconhecido |
Projetado pelo
francês Joseph-Antoine Bouvard (1840-1920), o Parque foi entregue em 1922, dentro das comemorações
do Centenário da Independência, como a principal área de lazer da cidade. Nela
funcionou um grande parque de diversões, chamado Shangai, havia um lago com uma
fonte e até a Ilha dos Amores, tudo registrado nos arquivos da época. Mas o “progresso”
trouxe mudanças substanciais, como a chegada dos viadutos a partir da década de
1960, que hoje são cinco, e a abertura da Avenida do Estado, descaracterizando
gradativamente a região.
Foto :Terminal de Ônibus - wikipédia |
O Parque perdeu cerca de metade da área verde que possuía quando
de sua inauguração. Posteriormente, veio a construção da Estação do Metrô e do
Terminal de Ônibus, que se tornou o mais movimentado da Capital. A decadência
da região e seu entorno se acentuou e atualmente ali se verifica umas maiores
concentrações de vendedores ambulantes e de moradores de rua de São Paulo. A
violência também cresceu, e o trânsito de pessoas pelas áreas arborizadas e
embaixo dos viadutos é pouco seguro, principalmente a passagem de pedestres que
separa o Parque do antigo Palácio das Indústrias, hoje Museu Catavento, e que
foi apelidada de “Faixa de Gaza”.
Foto wikipédia |
E assim, a revitalização do Parque Dom Pedro
II continua sendo apenas uma miragem, e a constante degradação da região, uma
dura realidade. Disso são testemunhas diárias os quase 3 mil alunos e
professores da Escola Estadual São Paulo, talvez o mais antigo estabelecimento
de ensino público da Capital, fundado em 1894, o primeiro a ter ensino
secundário, e que funciona no local desde 1958.
Todos convivem com a
insegurança, e não raro são vitimas de assaltos, principalmente à noite. Como
eu que, na gestão do prefeito Celso Pitta, fui abordado por dois pivetes quando
deixava o Palácio das Indústrias em direção ao metrô, e após passar pelas proximidades da escola. Foi-se um
relógio, mas, felizmente, ficaram os dedos.
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