quinta-feira, 22 de julho de 2021

Olimpíadas da Pandemia

 Olimpíadas 2020-2021

Estádio Olímpico de Tóquio construído em 2019 e que não terá público.

Símbolo Olímpico dos Jogos

Miraitowa - mascote da Olimpíada de Toquio 2021

    





Japão, de máscara, com silêncio e medo

As Olimpíadas de Tóquio, XXXII da Era Moderna, transferidas de 2020 (por causa da pandemia mundial) para 2021 e cuja abertura é amanhã (23), às 8hs de Brasília, serão definitivamente marcadas pelo Coronavirus que já ceifou mais de 4 milhões de vidas em todo o Planeta. E pela primeira vez na história dos Jogos, desde sua instituição na Grécia em 1896, não terá a presença de estrangeiros para acompanhar as competições nas arenas olímpicas. Desde dezembro, visitantes estão proibidos de entrar no Japão. E não mais do que 10 mil residentes locais, em cada arena, estão autorizados a assistir às competições, mas apenas as disputadas fora de Tóquio e sua região. Usarão máscaras, manterão distanciamento e só se manifestarão por meio de aplausos. Não poderão gritar, falar alto, nem levar comida e bebida aos locais.

O Imperador Naruhito fará a declaração oficial de abertura. E o desfile das delegações, de mais de 200 países, um dos pontos altos da cerimônia no Estádio Olímpico, construído em 2019, chamará mais a atenção pela ausência de público. Além do reduzido número de atletas: apenas 2 por país, um homem e uma mulher. De máscara e sem aquela confraternização no gramado após o desfile. Todos os juramentos serão feitos por duplas. 

Ainda não se sabe qual o personagem, normalmente um atleta,  entrará no estádio conduzindo a Tocha Olímpica que percorreu o país em um rodízio repleto de sobressaltos. E nem se o acendimento da pira, que arderá até o encerramento dos Jogos, será manual, como foi em 1964, ou utilizará algum recurso tecnológico de impacto visto em outras edições desde Los Angeles 84. 

A abertura deverá ser sóbria e o tema escolhido é "Unidos pela Emoção". A propósito, o compositor japonês Keigo Oyamada, autor de uma das músicas do tema, renunciou nesta segunda-feira (19) depois de admitir a prática de "bullying" agressivo contra portadores de deficiência, seus colegas de classe, nos anos 90. O caso vinha sendo publicado em jornais e revistas do país nos últimos dias. A última baixa foi a demissão, hoje (22) do diretor da cerimônia de abertura, Kentaro Kobaiashi, por ter feito, em 1998,  uma piada com o Holocausto dos judeus.

Até o apagar da chama olímpica, o medo da contaminação pelo vírus será uma ameaça constante. Para atletas, dirigentes, jornalistas e a população, mesmo cumprindo as rigorosas medidas de restrição impostas pelo Governo Japonês, o Comitê Organizador e o COI. Entre elas, testes diários para todos e o isolamento imediato de quem apresentar resultado positivo. No caso dos atletas, a desobediência  obrigará o infrator a deixar o Japão.

Com certeza estas Olimpíadas ficarão na história mais pelo que não aconteceu e menos pelo protagonismo dos atletas, suas grandes vitórias,  recordes e decepções nos 33 esportes em disputa. Ou por conta dos equipamentos de ultima geração já anunciados. Os pódios estarão vazios. Levadas em bandejas, caberá aos próprios atletas colocar as medalhas, de material metálico reciclável, nos próprios pescoços. Fato inédito e impactante.

Desde que foram adiadas para 2021, constatou-se que uma boa parte da população japonesa, ouvida em pesquisas, foi e é  contra a sua realização devido ao elevado número de casos e de óbitos pela Covid 19 no país. E que continua ameaçando de colapso o sistema de saúde em Tóquio, Osaka e outras cidades. O principal  jornal do Japão, Asahi Shimbum, um dos patrocinadores das Olimpíadas, chegou a publicar um duro editorial pedindo o cancelamento ou novo adiamento dos Jogos. E nas últimas horas, outro patrocinador, a Toyota, anunciou  que não mais vinculará ações relacionadas ao  evento em solidariedade ao povo.

Apesar disso, sob a argumentação de que foram implementadas rigorosas medidas preventivas para proteger e garantir a saúde dos mais de 11 mil atletas (302 do Brasil) que competirão e dos residentes no país, incluindo  a aceleração do processo de vacinação, a decisão de realizar o evento foi mantida. Pesou também o impacto econômico: o cancelamento das Olimpíadas mais caras da história, e das Paraolimpíadas, em seguida, custariam ao Japão cerca de 16,6 bilhões de dólares.

As Olimpíadas se estenderão até o dia 4 de agosto e é imprevisível que tudo aconteça com pompa e circunstância do começo ao fim, diante de tantos desafios e até fenômenos naturais como a possibilidade de um tufão. Desde o domingo, mais de 80  casos de contaminação pelo vírus foram confirmados, incluindo prestadores de serviços, jornalistas e quatro atletas na Vila Olímpica. E ontem a Guiné, que teria cinco representantes, desistiu, juntando-se à Coreia do Norte e Samoa. O certo mesmo é que as medalhas conquistadas não terão o mesmo brilho do ouro, prata e bronze das Olimpíadas de Tóquio de 1964. E estes Jogos também não deixarão o importante legado daqueles, os primeiros realizados na Ásia há 57 anos e num país em reconstrução.

Abertos pelo Imperador Hirohito, os Jogos de 64 tiveram a participação de 5.151 atletas de 93 nações. O momento mais emblemático  foi a entrada no estádio do jovem Yoshinori Sakai, de 19 anos, conduzindo a tocha olímpica. Ele nasceu em Hiroshima no dia 6 de agosto de 1945, quando a bomba atômica foi detonada sobre a cidade. Morreu aos 69 anos, em 2014, em Tóquio e era jornalista.

Yoshinori Sakai conduzindo a tocha olímpica em 1964

A escolha foi uma homenagem às vítimas do holocausto nuclear e um apelo à paz no Mundo. O mesmo Mundo, que por causa da pandemia da Covid 19 terá que se contentar em ver as  Olimpíadas  pela TV e Internet.  

                                                                        

Misha se despede em lágrimas em 1980

 


 

 

 

 

 

 

 

 

  

Para mim, passados 41 anos, o que jamais se apagarão são as imagens do ursinho Misha, mascote oficial dos Jogos se Moscou 80, impulsionado aos céus por balões coloridos acenando e em lágrimas. Um momento mágico que acompanhei da tribuna de imprensa do Estádio Lênin como enviado especial da Folha de São Paulo.